terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O que me inspira


..........................................................................................................  Mariana Moreira
 
Um primo situado entre meus minguados leitores diz que gosta de meus escritos, sobretudo, quando trago como mote situações e causos vividos na minha infância e adolescência, em Impueiras. Confesso que registrar um pouco esse período me dá uma imensa satisfação. Talvez esse seja meu estilo. Desculpem-me a pretensão. Falar de lembranças, momentos prazerosos vividos na infância e adolescência me inspira.

Como não se deleitar com as reminiscências das bocas de noites em que primos e compadres de meus pais nos visitavam na luz bruxuleante das lamparinas de querosene que projetavam sombras e davam materialidade aos causos de almas penadas, visagens, viagens fantásticas, parentes que arribavam nas secas e que surgiam nas cartas mal escritas que papai lia na sala de nossa casa entre murmúrios e lágrimas de saudades e sonhos de um lugar distante e diferente do sertão marcado pelos seus contrastes de secas e pujança das invernadas.

Como não ter prazer em lembrar o cheiro da terra molhada nas primeiras enxurradas e nos tampos de terra que rompiam com a força da babugem que vestia de verde os campos e roçados. A alegria de colher a água da chuva nas biqueiras da casa e usufruir mais tempo para brincadeiras uma vez que não teríamos que abastecer a casa com a água das cacimbas que, à medida que avançava o período de estiagem, ia se aprofundando em degraus vencidos com nossa força de crianças se equilibrando na lama formada pelos furos das surradas latas de querosene Jacaré transformadas em vasilhame para o transporte do líquido.

Como não ter o sabor da cana caiana descascada e degustada a sombra das frondosas mangueiras jasmin. Roletes que eram consumidos com o apetite despertado no intervalo entre as obrigações de casa e de ajuda nos afazeres domésticos e escolares e que deixavam marcados em braços e barrigas os vincos da garapa que escorria de nossas bocas inocentes. Como não reviver o gosto dos canapus, dos trapiás, dos oitis, dos jenipapos, das azeitonas, dos cajus colhidos nas aventuras de subir na árvore sem os limites do perigo. Do assar das castanhas e das brincadeiras de bitelo. Dos banhos de açudes e riachos na aprendizagem do nado com os cavaletes de tronco de bananeira. Das moagens no engenho da Coréia com o cheiro impregnado do velho motor a diesel, do sabor dos alfenins, das rapas de gamela, da prosa solta dos trabalhadores e cambiteiros, dos vôos das abelhas de arapuá na festa em torno das colunas de rapadura.

São episódios que, perdidos na poeira do tempo, ressurgem como seiva que alimenta a vida e mantém acesa a capacidade de sonhar e acreditar que, como as lembranças da infância e adolescência, hoje ainda podemos construir outros reinos, possíveis ou encantados, como encantados eram os reinados que Dona Elvira Paulo assegurava existir nas rugas do Serrote do Quati.

Mariana Moreira - é Carrazeirense da  gema do Sítio Cipó, professora, 
 radialista, jornalista... e um montão de coisas Boas!

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