sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

I Salão Oficial de Arte Contemporânea - há 34 anos atrás.

por: Cleudimar Ferreira


                         “Eis a nossa exposição.  É dos nossos artistas. É nossa arte. Se é pobre, é porque representa nossa miséria. Se não tem muita criatividade é porque nossa fome não deixa que ela desenvolva.” Assim fechou o último parágrafo do texto de apresentação do catálogo do 1º Salão Oficial de Artes Contemporânea do Sertão, a matriarca do teatro cajazeirense Íracles Blocos Pires, numa evidente demonstração de sentimento político pelos que na cidade, a duras penas, fazia uma arte de resistência e de enfrentamento, diante do isolamento social e cultural que impedia o acesso às novas estéticas e linguagens influentes que indicava o rumo que a arte devia seguir na época.

Essa arte referida por Íracles era específica, regionalizada e interiorizada. Não representava todo conteúdo exposto no Salão, pois o mesmo apresentou trabalhos de artistas de centros mais desenvolvidos, como Campina Grande, João Pessoa, Olinda/PE e Aracajú/SE.  Entretanto, embora ela não fosse consensual - já que poucos a conhecia ou quase não tinham acesso aos ambientes de trabalhos dos artistas, bem como, os locais onde eram expostas e por falta de informação, desconhecia o seu perfil estético; pelo menos era representativa, trazia na sua totalidade elementos que evidenciavam a ligação dos seus produtores com a sua terra, com sua gente e acima de tudo com as condições sociais que a região propiciava a sua produção.
 
É importante salientar que a cajazeiras dos anos 70, já era uma cidade que contemplava a Paraíba com uma acanhada classe de artistas formada por jovens politizados e ideologicamente centrados nos grandes fatos históricos que ocorria no país daquela época; e a arte produzida em seu tempo, boa parte estava a serviço da educação de outra parte da população considerada por segmentos de classe, como desinformada e despolitizada. Por isso, talvez neste contexto, os trabalhos plásticos apresentados no Salão carregassem um viés que adequasse sua produção a esse engajamento político/ideológico, ou simplesmente ostentasse uma forma ingênua de representar as mudanças ocorridas no meio onde viviam os seus agentes produtivos.

Os objetivos aparentes do Salão foram claros ao revelar aos olhos de todos no interior do Grêmio Artístico Cajazeirense, uma arte eclética, ingênua, ultrapassada diante dos novos conceitos de arte contemporânea apresentada nos grandes salões das metrópoles da sul do país. Essa arte embora arcaica para os padrões cajazeirense afigurava-se de viés estético desconhecido, adormecido e novo na visão de seus artistas, porém ignorada pelo poder público que ao longo dos anos tem sido ineficaz no apoio a cultura e arte advinda de locais mais afastados, como as cidades do interior, mas que surpreendia, dando aos artistas a conveniência de saírem do anonimato. “Tirar o artista que existe no povo e que por falta de  oportunidade fica entocado com medo e com vergonha de mostrar seus trabalhos.” Como afirmou a própria Íracles. 

Em outra parte do texto, Íracles questiona as dificuldades de se produzir arte distante dos grandes centros. “Nosso sertão é muito longe dos grandes centros. Nosso artista não tem escolas, na sua grande maioria é primitiva. Tem a chama da arte em si, mas não sabe exprimi-la como deseja, pois falta-lhe oportunidade”. Revela o acanhamento como complexo de inferioridade que impedia o artista de mostrar sua arte. “Nós tivemos a coragem de chamar esse artista, dar-lhe oportunidade, dizer-lhe que sua arte não decepciona que ela é autêntica e que ele, o artista, tem direito a seu lugar ao sol".

O Salão foi realizado há 34 anos atrás, entre os dias 10 e 30 de agosto de 1978, numa época difícil para as produções artistas no país que as duras penas enfrentavam o furor da censura ou fugia do seu rolo repressor. Mas foi em meios a estas dificuldades impostas, expeditivas de ansiedades, que os organizadores conseguiram fazer um evento que parou Cajazeiras. Foram expostos mais de 125 trabalhos, entre desenhos, esculturas, pinturas, tapeçarias e cerâmicas.

    ESPECIFICAÇÕES DO SALÃO   

S A L A  E S P E C I A L

Alfonso Bernal: Eros (equilíbrio), Eros (revolta), Eros (marionetes). Archidy Picado:
Marinha 1, Marinha 2, Retrato. Ricardo Aprígio: Campo 1, Campo 2, Campo 3. José Altino: Pasto e Repasto, O homem da terra e do sol, Pássaro de Prata. H. Helle Bessa: Composição 1, Composição 2, composição 3. Telam Rolim Cartaxo: Composição em Peixes 1, Composição em Peixes 2. Euclides Leal: Paquera, Retrato, O banho de Susana.

P R E M I A Ç Ã O

1º Lugar: Prêmio Banco do Estado da Paraíba para Irene Silva de Medeiros com a obra: Casa de Farinha. 2º Lugar: Prêmio PBtur para o pintor de Pincó Chico Jó com a obra Pilando o milho. 3º Lugar: Prêmio FUNCEP para Jackson Rathge Serrão com o trabalho Desenho I. Menções Honrosas para Alaíde Freitas dos Santos, Cerâmicas; Carmita Bezerra, Tapeçaria e pontões e José Azevedo (Zezinho Pintor), Uma Noite de Natal.

J Ú R I  D E  S E L E Ç Ã O  E  P R E M I A Ç Ã O

Alfonso Bernal, Arquidy Picado e Rurandy Moura.

P A T R O N E S S E

Mirtes Almeida Sobreira (Esposa do então Governador do Estado 
Ivan Bechara Sobreira).

C U R A D O R I A

Irácles Pires (Coordenadora), Telma Rolim Cartaxo (Assistente Técnico) 
e Alfonso Bernal (Programador Visual)

A R T I S T A S  P A R T I C I P A N T E S  E  S U A S  O B R A S

Aurora/CE: Raimundo Nonato Saraiva - Padre José Anchieta.
Aracajú/SE: Antônio Eugênio Ramos - Negra.
Bonito de Santa Fé/PB: Alaídes Freitas dos Santos - Folclore, 26 peças.
Bom Jesus/PB: Elias Francisco Costa. Botão I, Botão II e Botão III.
Cajazeiras/PB: Hélia Andrade - Maria Bonita do Sertão e Da família andrógena. Francisco de Assis - Auto retrato. Maria Inês Claudino Braga - Consciência. Francisco Marcelo Braga Carvalho - Sala de torturas, Uma dama na corte e Cristo. Marluce Martins Duarte - Hóstia Santa. Gute -Técnico Sônia. Natécia Marques - Xangô, Sociedade e Boqueirão. Vitória Rolim - Paisagem. Marli Matos Sá - Pastor e Natureza morta. José Trajano - Corrente de madeira. Linduina Vieira - Ex-votos e Mariano. Wilson - Cristo, Rua de Ouro Preto, e Cangaceiro.
Campina Grande/PB: João Avelino da Silva - Gravura I, Gravura II  e Gravura III. Irene Medeiro Silva - Casa de Farinha e Candomblé
João Pessoa/PB: Reginaldo Alcântara - Cicatrizes, Sala de recepções e O outro sol. Ana Benêvola - Somana e O enigma do eu. Bernadete de Lourdes Costa Braga - Cristo Médico, Praia nordestina. Elpídio Dantas - Mulher, Mulher e Criança, Paisagem. Bento da Gama - Conexão, Transparência e Interseção de formas. Dalberto Henrique de M - Mulher e frutas, Madona, Madonas. Maria Luiza - Composição I e Composição II. Paulo Roberto Melo - Beija Flor I, Beija Flor II e Beija Flor III. Jairo Mozat - Descanso do guerreiro e Destruição. Evaldo Fabiano F. de Freitas - Uma esmola pelo amor de Deus. Welington Rocha - Máscara I, Mascara II e Mascara III. Jacksom Rathge Serrão - Desenho I, Desenho II e Desenho III. 
Juazeirinho/PB: Fernando Fernandes - Recomeçar, Sentimentos e Meditação.
Olinda/PE: Vitória Kessler - O pilão, O Quebra Panela e Favela.
Patos/PB:  José Azevedo (Zezinho Pintor) - Uma noite, José Pretinho e o Cego Aderaldo no martelo agalopado, O Vaqueiro do Sertão. Marcos Meira Cesar - Sem título I e Sem título II. Irmã Madalena - Vaqueiro, Solidão, Sertão. Fernão  Dias de Sá. - A grande síntese, Rua do tostão, Cristo a vontade e Almas de Bailarinas.
Pombal/PB: Maria do Carmo Bezerra - Pontões, Congadas e Irmandade do Rosário. Maria Araújo Farias - Paisagem sertaneja, Paisagem sertaneja e Noite.
Piancó/PB: Teresa Alencar - Cubismo e Namorados. Ivan - Cristo. Chico Jó - Debulhando Milho, Pilando Milho e Peneirando Milho. Márcia - Baiana, Historinha e Pescador.  
Pilar/PB: Isaias Alves de Costa - Fome. 
São José de Lagoa Tapada/PB: Natal Batista - Vaqueiro I e Vaqueiro II. Socorro Batista - Namoro, Noivado, Casamento. Das Neves - Namoro e Enamorado.
Santa Helena/PB: Berenice Ricardo Rolim - O Cristo e Casa da Fazenda.
Sousa/PB: José Vieira da Costa - O Garí estilizado. Vânia Pires Ferreira - O cortejo, Adão e Eva e O velho e a Velha. Maria Auxiliadora Pinto Lopes - Preto velho e Pilando sonhos; Maria Emília Pires  - O galo e Losangos. Graça Rodrigues - Mãe Proveta. Daví Bezerra Vasconcelos - Piquenique e A sertaneja.
Uiraúna/PB: Laércio Pinheiro  da Silva - Caminho para cidade, Cruz. João Neto Batista - O amor, Uma crítica (pra que) e Camponesa. 




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