domingo, 28 de outubro de 2012

Ecos de vozes ............Crônica de M a r i a n a  M o r e i r a


A ocasião do encontro não foi de festividades e efusões. Mas, a sinceridade das palavras foi tocante. Inclusive, com sugestões como a de reunir em uma publicação os muitos escritos que produzi ao longo desta minha vida de pretensa colunista, e de escrever um comentário sobre as afinidades entre Cajazeiras e Juazeiro do Norte. O apoio veio de Ducílio Elias que se revelou um assíduo leitor de meus escritos. As sugestões, com certeza, são sempre consideradas e ponderadas por mim. Mas, o encontro me cutucou lembranças de infância quando, ainda morando em Impueiras, colava o ouvido no pequeno rádio de pilha para ouvir, no início da noite, pela Rádio Alto Piranhas, o Programa Raio de Luz, apresentado por Ducílio Elias. Encantava-me tanto pelas mensagens, de voz e musicais, travestidas de forte motivação de paz, como pela beleza da voz que as anunciava.

Muitas vezes quando os recursos eram insuficientes para a aquisição de pilhas e ante a inexistência de energia elétrica onde morávamos, percorria alguns metros até a casa de Madrinha Zefinha Moura, irmã mais velha de meu pai, somente para não perder a audição do programa. Um percurso pequeno, de cerca de duzentos metros, mas que o fazia sempre com um frio na espinha temendo as apavorantes estórias de maus assombros e visagens que a modernidade da energia elétrica e das comunicações afugentou para um mundo encantado que a racionalidade de nossos tempos não consegue alcançar. Para espantar o medo cumpria o percurso correndo e cantando musicas religiosas que a memória buscava gravar das audições recentes. Ainda tenho nos arquivos da lembrança farelos de versos como: “Diz o A Ave Maria. Diz o B bondosa e bela...”.

Mais tarde, quando vim estudar em Cajazeiras, com o consentimento de minhas irmãs mais velhas, fui sozinha da Rua Doutor Coelho até o prédio da Rádio Alto Piranhas que, na época funciona contígua ao Cine Apolo XI, apenas para conhecer o dono da voz que me encantava e que, ao lado de Dona Íracles Pires e de seu Mini Discoteca Dinamite, me instigavam a sedução pelos meios de comunicação e pelo jornalismo. Fascinei-me pelos estúdios, os microfones, um mundo irreal e fantástico para uma menina que saia da simplicidade da vida em Impueiras, cercada de estórias de trancoso e brincadeiras de boneca de pano e de cabaça. As músicas que eram lidas pelas agulhas dos toca discos emitiam um chiado que encantava enquanto os discos de vinil em seu movimento giratório hipnótico soltavam sons e acordes inebriantes. A luz vermelha do aviso de “no ar” disseminava uma sensação de futuro, de um tempo inimaginável.

Mais tarde, como profissional, o cotidiano da atividade jornalística em emissoras de rádio me colocou em contato direto e assíduo com esse mundo. Mesmo assim, ainda hoje, sinto a sedução e o encanto que a voz de Ducílio Elias e de Íracles Pires me despertou na infância e as ondas hertzianas continuam sendo uma possibilidade de um tempo em que a distância entre minha casa e a de Madrinha Zefinha era feito com pés ligeiros, sombras e projeções de inimagináveis seres sobrenaturais e a entoação de músicas alegres.

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