quarta-feira, 5 de junho de 2013

E o brincante se foi...


Cajazeiras se despede de seu maior e mais irreverente personagem. Defensor do folclore de sua gente e baluarte na preservação da cultura popular da cidade, João de Manezim, o brincante, o carnavalesco, já não está entre nós, partiu com suas peripécias, espertezas e inteligência. E foi descontrair outras vidas em um plano mais espiritual. Sua morte vai deixar saudades. Saudades de uma “Cajazeiras” antiga, arcaica onde João com suas charangas, Jaraguás e cabrochas da Camilo de Holanda era nosso rei na folia e na avenida. Quem não sambou com João, quem não brincou com João e quem não sorriu com João, não trazia nas veias o sangue bom dos cajazeirenses. Que os céus façam festas, pois o brincante se foi... E a sua acolhida, deve se reverenciada com festa. Como era uma festa a sua vida entre nós. 

Abaixo dois artigos escritos por Nonato Guedes e Valiomar Rolim que caracteriza bem o perfil de João de Manezim.




Morre João de Manezim, figura popular em Cajazeiras.
Nonato Guedes

Figura popular na cidade de Cajazeiras, o funcionário público João Rodrigues, conhecido como “João de Manezim”, morreu na noite de ontem aos 72 anos de idade, depois de lutar durante meses contra um câncer no fígado. O portal “Diário do Sertão” revela que João ainda foi levado para o Hospital Regional da cidade, mas não resistiu e veio a óbito, tendo passado, também, por vários exames em João Pessoa, com a ajuda de amigos. Folclórico, ex-dono de circo, de um clube popular, de um time de futebol e de uma escola de samba num bairro pobre de Cajazeiras, “João de Manezim” foi vereador na década de 80 e apelou para um recurso criativo para se tornar elegível: condenado a oito meses de prisão por ter agredido o ex-coletor estadual Inácio Brito dentro da repartição, foi beneficiado com “sursis” por dois anos, mas resolveu cumprir a pena. Disputou o mandato pelo PDS e ficou recolhido em sala livre na cadeia pública, onde fez campanha, recebendo visitas e encaminhando pedidos de favores a líderes políticos.

Animador de campanhas, de candidatos do governo ou da oposição, ele criou um slogan original para sua candidatura: “Ruim por ruim, vote em João de Manezim”. O incidente com o ex-coletor ocorreu quando João, que era auxiliar de serviço do Colégio Estadual, foi à repartição receber seu salário e “furou” a fila. Os dois se desentenderam e brigaram. Antes, ele havia sido detido outras vezes por se envolver em incidentes, geralmente sendo solto graças à interferência de políticos e amigos. Filho de pais pobres, ele conseguiu ter livre trânsito na sociedade local, à qual recorria para suas variadas promoções. Não tinha sequer o curso primário, mas se achava em condições de ser vereador por ter observado “o baixo nível” de alguns oradores com assento na Câmara Municipal. O então governador Tarcísio Burity ajudou-o a renovar o instrumental da escola de samba de sua propriedade, que desfilava anualmente no carnaval. Imprevisível e irreverente, João inaugurou o equipamento numa passeata de protesto contra o governador, liderada pelo então suplente de senador João Bosco Braga Barreto, do PP.

A ideia de ser candidato surgiu quando, a pretexto de comemorar a saúde de um integrante da sua escola, que escapou de um tiro no olho, João fez uma passeata com quase três mil pessoas, em que distribuiu duas mil velas e mil estátuas pequenas de Padre Cícero, doadas por políticos e pessoas ilustres da cidade. Na disputa de 82, “João de Manezim” tentou repetir uma tática usada pelo deputado Genival Tourinh, do PP de Minas Gerais, para continuar elegível. Tourinho fora processado com base na Lei de Segurança Nacional e condenado com direito a “sursis”, mas se fosse beneficiado pelo “sursis” ficaria inelegível em 82, o que não aconteceria se cumprisse a pena de seis meses a que fora condenado. Genival Tourinho reafirmou, na época, a disposição de se apresentar para cumprir a pena, desprezando o “sursis”.

No livro “Cajazeiras e minhas lembranças”, Irismar Gomes da Silva traçou um perfil de João, afirmando: “Quem não conhece João? De quem é filho? Como foi criado? Onde nasceu? João é uma pessoa que pelo seu poderoso senso de humor e pelo extraordinário espírito de criação e decisão, tornou-se uma figura folclórica, importante e conhecida não só em Cajazeiras, mas em toda a região e, por que não dizer, nacionalmente, quando foi manchete num conhecido canal de televisão. João Rodrigues, nome de batismo dado pelos seus pais Manoel Rodrigues e Sebastiana Maria da Conceição, é natural de Cajazeiras, precisamente da zona sul da cidade. 

fonte: ac2brasilia.blogspot.com


As aventuras de Pedro Manoelzinho ou João Malazarte.
Valiomar Rolim.

João de Manoelzinho, homem simples, semianalfabeto, provido de toda brutalidade, esperteza, valentia, criatividade e até delicadeza que a universidade da vida pode dotar, marcou presença como um Pedro Malazarte da Cajazeiras dos anos sessenta e setenta. Enfrentando a lâmina tênue da vida como um verdadeiro sobrevivente da pobreza, da fome e da violência, fez de sua vida um verdadeiro desafio, uma provocação ao otimismo, um brinde à perseverança, ocupou-se sempre em “empreendimentos” marcantes, nunca sobrou tempo para lamentações.

Nas proximidades da Praça Camilo de Holanda, onde seria construída a igreja de São João Bosco, aproveitava a saída dos fieis da missa campal que se celebrava nas tardes de Domingo, num circo mambembe, anunciou a sensacional “mulher que vira peixe”, casa lotada. A jovem artista, que nas horas de trabalho fazia ponto na palha, ao ver tamanho público, não teve coragem de apresentar-se e forçou João de pedir a Zefa dos Peitão um soutien e uma calcinha emprestados para fazer, ele mesmo, a apresentação.

A entrada da figura no picadeiro já provocou uma gargalhada geral, maior ainda quando o baixinho Zé Baleia, o assistente, entrou empurrando um carrinho com os objetos de cena. A plateia estava totalmente entregue à risada quando a “artista”, tirou do carrinho uma frigideira com um peixe dentro e balançou-a com movimentos em que o peixe virava de um lado para outro. A assistência foi à loucura. Homens, mulheres, meninos e até o padre, que saíra da missa direto para o circo, faziam do ambiente a maior balbúrdia, mas a “mulher” estava virando o peixe e foi o prometido. Restou da história a saída de todos, rindo ou reclamando, e a descrença no circo do J. Manoelzinho.

Não havia de ser nada, o circo foi a Jatobá, cidade a 30 quilômetros de Cajazeiras, lá a atração foi o homem que entrava em quatro garrafas. Casa cheia, depois que João, à hora da atração máxima, disse que só um louco acreditaria naquilo e , para cumprir o prometido, colocou um dedo em cada uma das quatro garrafas, a turba destruiu o circo.

Sem circo e sem dinheiro, João foi a Ipaumirim/CE, alugou o cinema local e anunciou o show da noite: o homem que desaparece. Casa cheia e público impaciente, passadas duas ou três horas sem que começasse o espetáculo, alguém da plateia foi à bilheteria informar-se sobre o início da função, soube-se então: o homem desaparecera.

De saco cheio do mundo dos espetáculos, fundou um clube que ficou famoso, pelo episódio de um pai, que perguntando se sua filha moça ali estaria.
-Moça? Aqui não tem, pode até entrar, mas não sai moça.

Voltou-se para o futebol, foi a Juazeiro do Norte - CE e acertou um jogo entre a seleção da cidade e o Botafogo de Cajazeiras, que estava na liderança do campeonato matutão na Paraíba. No acerto, comprometeu-se em levar a filha do prefeito de Cajazeiras para dar o pontapé inicial. Levou seu velho time, o Íbis, como se fora o Botafogo, e uma das meninas da palha para posar de filha do prefeito.

Aos dois minutos do primeiro tempo o “Botafogo” fez um gol, foi só isso. O jogo terminou com o placar de 9x1, para o time da casa. Não deu outra, saiu do estádio debaixo da maior chuva. Copos, garrafas, chupas de laranja, tudo que se podia jogar. Foi preciso proteção policial para a equipe sair do estádio. Ficou barato, João recebera o pagamento antecipado.

Quando Chico Rolim assumiu pela primeira vez a prefeitura da cidade, pressionado pela falta do produto, aumentou o preço da carne e provocou a maior grita na cidade. As difusoras fizeram o maior estardalhaço, a população não falava em outra coisa e a oposição, ainda não refeita da derrota recente, aproveitou a deixa para começar a campanha seguinte. A cidade fervia tudo o que acontecesse era creditado (ou debitado?) ao aumento da carne.

O prefeito, para diminuir o estrago, negociou com os açougueiros, beneficiários da medida, a doação de toda a carne com osso à população carente. Foi uma festa, era pirão com cachaça por tudo que era lugar.

fonte: oultimodosmoicanos-cludiomar.blogspot.com.br









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