terça-feira, 27 de agosto de 2013

Documento Histórico

Diogo Velho Cavalcante de Albuquerque
Presidente da Província do Ceará (1868-1869)

Ofício do Padre Rolim ao Presidente da Província do Ceará Diogo Velho Cavalcante de Albuquerque, (17 de agosto 1868 a 24 de abril de 1869) revela a sua preocupação com a necessidade do aproveitamento dos recursos naturais da Região do Araripe, para o desenvolvimento agroindustrial do cariri, como forma de combate as secas. Na época, por volta da década de 60 do século XIX, o padre cajazeirense, exercia suas atividades sacerdotais na cidade do Crato/CE. 


Padre Inácio de Sousa Rolim
Ilmo. Sr. Presidente

Na digna pessoa de V. Excia., respeito a primeira autoridade da província. De-sejo que V. Excia. se digne prestar-me um pouco de atenção sobre o que passo a expor. Acho-me, presentemente, nesta comarca do Crato, e seja qual for a minha pátria, a minha idade, a minha capacidade, a minha disposição, desejo prestar-me a serviço de meu país, enquanto a morte não reclamar os seus direitos sobre mim. Este maravilhoso Cariri, atravessado de noroeste a sueste por uma ramificação da grande serra que aqui tem o nome de Araripe é em muitas partes regado por águas cristalinas que, em torrentes mais ou menos abundantes, arrebentam de profundos vales nas encóspias (sic) da serra e formam arroios donde os habitantes industriosamente extraem córregos ou levadas de água para as suas lavouras durante a seca. As faldas da serra constando de terras ora arenosas, ora argilosas e sempre boas para toda sorte de vegetação, têm a vantagem de poder ser favorecidas d’água na estação seca; e é para lamentar que tais terras não estejam cobertas de videiras, árvore do pão, oliveiras, figueiras, árvore de leite, chã da índia, cacau, tâmaras, sagu, as quais aqui se alimentam mui bem, como tem sucedido às outras árvores exóticas que aqui vemos e que vegetam tão bem como as indígenas do Cariri. Decerto a indústria europeia teria melhorado muito bem uma tal terra, onde ao tempo da seca correm regatos de boa água em tal abundância que chegam para regar extensas campinas. O solo produz bem toda a qualidade de cereais que aqui se tem plantado. Eu acho-me agora na diligência de experimentar uma plantação de trigo, trabalho este que empreendo com o fim de induzir os fazendeiros do campo a fazerem alguma cultura desse importante gênero. Visto que V. Excia. é quem presentemente tem em seu  poder os destinos desta Província, a quem, senão a V. Excia. devemos nós recorrer? Sei que esta requisição não está isenta de ser taxada de intempestiva e até absurda e para V. Excia. escusada, uma vez que bem conhece as circunstâncias atuais, as necessidades da Província, as localidades e propriedades dos terrenos; todavia, é urgente que nós sejamos importunos em busca de melhoramentos, e se V. Excia. quiser ter a bondade de atender a esta humilde declaração, a minha esperança a tal respeito não ficará frustrada; porque então V. Excia. dará as providências necessárias e munindo-se de autorização pela Assembleia provincial, em razão da despesa, requisitará da Sociedade Auxiliadora da Indústria do Rio de Janeiro aquilo que agora pedimos como mais necessário. Pelos nossos sertões já se vai plantando algum trigo, porém o trigo que me parece preferível a todos é o sarraceno ou negro que se planta nos Estados Unidos, no Rio de Janeiro já a Sociedade Auxiliadora da Indústria tem dado sementes!

Alguns moinhos que se têm empregado para alguma trituração de trigo são impróprios para isso; portanto, é necessário mandar vir da América Inglesa algum moinho excêntrico, ou capaz de triturar bem. As vides que devem servir para o fabrico de vinho no nosso país são do gênero Vitis labrusia, sendo preferível a espécie Catawba, que se cultiva em grande escala nos Estados Unidos. Quanto ã oliveira, será difícil transplantá-la, mas não creio que seja impossível. A árvore-vaca, ou de leite, que é indígena na Venezuela, se já não há na Caiena inglesa e holandesa, será pela dificuldade de propagar-se.

Em suma, os nossos objetivos de encomenda reduzem-se a sementes de trigo negro ou sarraceno, um moinho excêntrico, se- mentes ou pés de Catawba, e repentões (sic) ou pés de oliveira.

De V. Excia. súdito respeitado e capelão

Inácio de Sousa Rolim
Cidade do Crato, 19 de novembro de 1868.



fonte: livro "As crônicas de um mestre escola"

Nenhum comentário: