segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

O modernismo de Cajazeiras/PB a partir da cultura teatral (1950-1960) 

Para quem tem curiosidade em saber, ou se interessa pela história do teatro em Cajazeiras, esse Vídeo amador, mostra alguns tópicos dessa história que foi o referencial nas artes cênicas do Sertão. O material foi desenvolvido por Lidiane Lima Estrela, Walter Nunes de Sousa e Yan Bezerra, alunos da disciplina História do Brasil IV, do Curso de História da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).

   




sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Cajazeiras viu a banda passar! Não era a sua, mas era a deles de Serra Grande.


Porque não temos a nossa 
cabaçal tocando?

Cleudimar Ferreira


No dia 11 deste mês de janeiro, Cajazeiras foi a praça não para ver a banda passar cantando coisas de amor, mas para ver a banda tocar cultura popular viva, autêntica, que só o Nordeste tem. Só que a banda da vez não era a Banda de Música Santa Cecilia; Também não era camarata da cidade; ou mais remota ainda; também não era a sua Banda Cabaçal. Era a genial Banda Cabaçal da Cidade de Serra Grande/PB, uma cidadezinha simpática do Vale do Piancó, que fica situada sobre um elevado, na microrregião de Itaporanga.

Pois bem, se comparada com Cajazeiras, é como se Serra Grande fosse uma gota d’água no Açude Grande, já que a mesma, acho, deve ter hoje pouco mais de quatro mil habitantes. Entretanto, como em terra de gigante, todo pequinês é grande, o que difere Serra Grande de Cajazeiras, é a força incomum dos seus agentes culturais de preservar suas tradições e a cultura popular de seu povo. Um diferencial que em nossa querida Cajazeiras, nossos abnegados agentes da cultura, parece ter perdido as referências nesse sentido, ou não souberam, ou não aprenderam a fórmula ideal para não ficar “atoa na vida” e assim, arregaçar as mangas da inoperância, que dê pelos menos ânimo para cobrar do poder público, aquilo que é assegurado por direito, que é o de preservar as raízes culturais de um povo que cresceu debaixo de um chavão, que alto proclamou  chamar de “Terra da Cultura”.

  Antiga Banda Cabaçal de Cajazeiras, em 1938.

Por que não temos a nossa cabaçal tocando? Digo isso porque em tempos de NEC; de leis de incentivos à produção cultural; de FIC Estadual, FUMINC e tantos outros vieses que se expõem, aos olhos de quem produzem arte nesse Estado, o nosso Grupo de Reisado, a nossa antiga Banda Cabaçal, continuam no seu adormecimento profundo, no mais absoluto silêncio de quem parece que não acordará jamais. Talvez, seja o fato que a cultura de Cajazeiras vive hoje em outro patamar de inferioridade, ou obsoleta para os novos ritos culturais da contemporaneidade, e, portanto, é mais interessante investir em risos e abraços de incentivos a cultuara popular na Comunidade pifeira do Sítio Antas em São José de Piranhas, ou mesmo, na já consolidada Banda Cabaçal de Serra Grande.


Banda Cabaçal de Cajazeiras, nos anos 80

Será que, apesar dos mixuruquíssimos valores do FUMINC para a cultura local, não sobraria alguns trocados para revitalização do Grupo de Reisado e para a nossa amarelada Banda Cabaçal, que só existe em preto e branco na imaginação dos cajazeirenses. Será que, na falta de uma inteligência na cidade, com capacidade de elaborar e executar um projeto, com poder de convencimento na Comissão Técnica de Análises de Projetos do FIC, não seria o caso da Gestão Municipal, emprestar um de seus agentes culturais para a tarefa!? Ou seria uma outra solução, copiar a fórmula que Serra Grande adotou para barganhar valores do FIC e assim, tirar do ostracismo a nossa lendária Banda Cabaçal?

Desse modo, nem tudo está perdido na terra da cultura. E se Serra Grande que não tinha (salve-se a minúscula Secretaria Municipal de Cultura) praticamente nada, mas criou a sua Banda; como consolo, o nosso socorro viria do que nós temos; já que temos a Secult; temos NEC; temos a 9ª Região de Cultura; o Coletivo Cultucar; e temos ainda, a Casa da Cultura Independente e por assim segue outras instituições. Porisso e por muito mais, ir a Praça Nego Zé ver os senhores do pífano de Serra Grande tocar, não houve programa melhor. E não haveria coisa melhor, se a apresentação fosse de uma manifestação popular originária na própria cidade de Cajazeiras.






Chuvas
José Antonio Albuquerque


A chuva tem um poder mágico sobre mim. Creio que sou um ser meteorológico. Minhas emoções se aguçam, ficam receptivas e tensas quando chove. Eu gosto de olhar a chuva, de sentir a chuva. Quando a chuva chega pela madrugada, gosto de sair e contemplá-la e fico ouvindo a sua pancada nas telhas e a água a escorrer pelas biqueiras. Tanto gosto da chuva mansa, fininha como as que vêm acompanhadas de relâmpagos e trovões. E o cheiro da terra molhada? Ah! Como me faz bem.

Quando a chuva “me pega” no meio da rua, procuro um abrigo e fico olhando as pessoas atravessando, apressadas, correndo. Uma pessoa andando pela calçada toma um banho de água misturada com lama à passagem de um carro bem perto do meio fio. Tudo indica que o gesto foi de propósito. Nesta ocasião os palavrões vêm logo em seguida e o motorista simplesmente ri.

Nunca perguntei a minha mãe, mas acho que nasci numa noite de muita chuva, anunciada por muitos relâmpagos e trovoadas. Só pode ter sido, porque a chuva faz parte da minha vida, me traz felicidade, ternura e sinto vontade até de fazer poesia, mas me falta o dom.

Será que a chuva não é o céu chorando pelo sofrimento de tantos que passam fome, que vivem na pobreza e que são massacrados pelas injustiças praticadas pelos próprios homens?

Será que a chuva não é o céu chorando em lugar das pessoas que já não têm mais lágrimas para derramar depois de ter passado tanto dor e muito sofrimento?

Será que as chuvas que vêm acompanhadas de fortes relâmpagos e raivosos trovões, não são para alertar os homens, fazendo um apelo para que possam ser mais humildes, mais humanos, mais cristãos?

Mas é esta água pura que jorra dos açudes do céu que inundam os rios, enchem as barragens, transbordam nas grotas e aumenta a água salgada dos oceanos, que nos servimos dela no dia a dia e sem ela não teríamos condições de sobreviver.

É a água que corre nas biqueiras das casas que faz a alegria da molecada, em dias de boas chuvas, misturando-se meninos e meninas e disputando no empurrão o melhor lugar em baixo dela. Como é bom e gostoso tomar banho de chuva. A água é muita gelada, chega deixa os lábios roxos de frio.

Como é bom e gostoso tomar banho de chuva. É como partilhar das alegrias das nuvens que derramam as águas abundantes para molhar a terra que fará nascerem as sementes e acontecer o milagre da multiplicação.

Qual é o sertanejo que não gosta de chuva? Qual o homem do campo, que ao plantar a semente no chão, não olha para o céu e não pede chuva “para este sertão sofredor? ”

Anos atrás fiz uma pequena barragem numa “garra de terra” que possuo. Na segunda chuva, depois de concluída, arrombou-se. Meus amigos ficaram surpresos com minha felicidade e indagaram: você não está triste? E respondi: prefiro vê-la arrombada pelo volume de água do que seca, pela ausência da chuva. Na noite em que a barragem arrombou, um pluviômetro, que só mede até 135 mm, simplesmente “sangrou”. Não tenho ideia quantos mm deu a chuva que levou a parede do meu açude. Os mais entendidos disseram que a mesma ultrapassou os 200 mm. É provável.

Mesmo quando o céu chora, lágrimas de chuva, mesmo quando os trovões se esgoelam de raiva e os relâmpagos com sua virulência enviam os seus raios em busca da terra, depois de tudo vem a bonança, vem o sol, vem o sorriso do homem do campo quando vê a semente que plantou nascer e frutificar.

Depois da chuva o vento sussurra e se acalma. As águas voltam ao seu leito normal, tudo é silêncio e melancolia. Mesmo assim voltamos a plantar os olhos no céu aguardando novas chuvas.

É assim a vida do sertanejo, que durante doze meses, só vê chuva num período pequeno do ano, quando ela vai embora já fica com saudade e aguardando o ano novo.

E a chuva continua rolando, como lágrima em nossa face, mas o céu não está chorando... 1958?

Os estudiosos alertam que o ano de 2016 será ruim de chuva e que poderá ser igual ao ano de 1958, quando foi registrada uma das secas do nordeste brasileiro.







fonte: GAZETA DO ALTO PIRANHAS

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Um passeio pelas ruas de Cajazeiras. A cidade cresceu, não teve jeito.


Veruza Guedes tem mais talento para a crônica do que ela possa imaginar. Dia desses postei um poema aqui (http://ac2brasilia.blogspot.com.br- Chuva de meninos - que falava da gurizada tomando banho na Rua 21 de Abril, em Cajazeiras, onde morei parte de minha infância. Veruza morava numa rua ao lado e fez uma crônica que de certa forma dialoga com meu poeminha. Gostei muito e viajei no tempo lendo a crônica, lembrando dos ferreiros e de alguns personagens inesquecíveis presentes em seu texto. Vamos ler, gente:
Linaldo Guedes




Na Rua 21 de abril
* Veruza Guedes 

A Rua 21 de Abril tinha uma ladeira em espiral que dava para outras ruas de minha infância. Todas elas eram boas de brincar. Quando chovia a molequeira corria pelas biqueiras, escorregando nas calçadas de cimento lisinho. Se a chuva parava a molequeira fazia uma oração esquisita pedindo a sua volta. Se a chuva se recusava a voltar, lá íamos, todos molhados, explorar outras brincadeiras.

Mas o que mais me chamava a atenção na Rua 21 de Abril eram os quintais que davam para grandes descampados. Os adultos chamavam de lixão, mas nós víamos uma imensidão de possibilidades para alimentar a nossa curiosidade e cair na conversinha mole de seus moradores. Tenho a impressão de que as crianças da 21 de Abril eram mais espertas do que nós.

Na minha casa da Higino Tavares o quintal também dava para um enorme terreno, com uma casinha de barro batido, onde uma velhinha simpática, a dona Chicola, criava muitos gatos. Aquele quintal, cheio de mato, engolia meus brinquedos. Depois que algo era jogado lá, dificilmente se recuperava.

Hoje quando passo nessas ruas e não vejo mato algum sinto uma estranheza, um sentimento de frustração por saber-se perdida. Nem o ferreiro bate mais a sua cantiga solitária de ferro contra ferro levantando faíscas. Nem as galinhas de Dona Murica ficam correndo pelas ruas em fuga. 

Nem o Seu Expedito passa mais a sorrir espantando as crianças. Nem Dona Toinha fuma mais seu cachimbo na calçada. Nem Nazaré passa de tranças longas vendendo seu doce de leite com casquinha. “-Rubis, deixou a bodega sozinha? - Eu não podia com ela nas costas!”



fonte: ac2brasilia

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Cajazeiras Mambembeia no Conchavódromo

   memória   

Reveja um artigo inteligente, bem-humorado de autoria de Chico César, que conta a história do antigo Grupo de Teatro Terra e a passagem do grupo por Brasília, durante o Projeto Mambembão de Artes Cênicas. O artigo foi publicado no Jornal O Norte, página 5, em julho de 1984.

Cajazeiras Mambembeia no Conchavódromo

por: Chico César (ao pessoal da FPTA).

Os lotes e superquadras de Brasília, palco costumeiro de rachas, rixas, cochichos e conchavos de parlamentares, e, vez por outra de algum concerto contemporâneo feito por centenas de buzinas, vozes e panelas, está sendo abrigo provisório, durante esta semana, de outros atores e outras apresentações. Trata-se do Projeto Mambembão. Nele, estão 14 meninos e meninas de Cajazeiras, integrantes do Grupo Terra, que foram ao Distrito Federal para apresentar a peça “Beiço de Estada. ”

Depois de mambembear “o que há de bom” em Brasília, ao lado dos grupos Só-diretas, Pro-diretas e Pós-diretas (?) o Grupo Terra se apresentará em Porto Alegre, Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro. Não se pode dizer que eles estejam procurando Sarney pra se coçar, mas as notícias que chegam é que, ao pisa concreto na cidade-avião voo rasante – assim cantada por Ednardo, não silenciaram e interviram no poema práxis inaugurado por Niemayer e Juscelino.

O repórter Luis Turiba, do Jornal de Brasília da última quarta-feira, conta que “eles deitaram falação sobre os assuntos do momento: Roberta Close, sucessão presidencial, punk-break, Lula, Zé do Norte e miséria”. Insatisfeitos com tanto bate-boca, ainda “acuraram o repórter de malufista. ”

A crítica do Última Hora, também de Brasília do mesmo dia, considera que “Beiço de Estrada” é “um trabalho marcado pela juventude e entusiasmo de um pessoal que escolheu o teatro para brincar a sério com a vida. ” Para o crítico deste matutino os meninos de Cajazeiras estão aí, pedindo passagem e dispensando afago da cabeça. Nem precoces nem iluminados. Simplesmente, gente de teatro. ”

Um dos fatores que de imediato está chamando atenção do público e da crítica do Planalto Central do País”, onde Caetano Veloso se dispôs a organizar o movimento e orientar o carnaval, é a pouca idade dos garotos de Padre Rolim. A média é de 18 anos, o mais velho é diretor e tem 23, enquanto dois deles têm apenas 15 e para viajar precisam da autorização dos pais e do Juizado de Menores da Comarca de Cajazeiras.

Nos meninos observa-se ainda o florescer de um buço, leve ameaça de bigode em futuro longínquo. As meninas, como dirão suas próprias mães, “ainda estão em formação” Algumas delas, como se dizem Nova Olinda para a primeira menstruação, “quebraram o pote” a poucos dias: Estão adolescendo juntos há nove anos. Descobrindo e inventando.


A impressão derradeira que se tem do grupo não é a do sentimento paternalista. Isto é o que “Os Heróis de Cajazeiras” como são chamados pela crítica brasiliense, mostraram há alguns meses, quando arrumaram as malas e, só com as passagens de ida, foram para São Jose do Rio Preto, onde participaram de um festival nacional de teatro e receberam a terceira colocação. O público, segundo os integrantes do “Terra” queria o primeiro lugar para “Beiço de Estrada” e protestou. O resultado foi a realização de três apresentações, no Teatro Eugênio Kunset, em São Paulo, com o apoio da classe teatral paulista.

A história desse grupo começou em um fundo de quintal, de uma rua de nome Higino Rolim. Era uma vez, na cidade de Cajazeiras, musa de Sergio Ricardo em “Noite de Espantalho”, uma patota de meninos e meninazinhas que brincava de fazer drama, usando os lençóis e toalhas de suas mães como pano-de-roda para ser o circo, ambiente clownesco para proteger a emoção infanto-juvenil das brigas entre os caciques das oligarquias políticas locais.

Para sonhar junto com estes pirralhos, a meninada pagava um palito de fosforo, um maço de cigarro vazio ou um papel de bala, sob a ameaça, e claro, de levar um ou outro cocorote ou tapa-ôi, materno ou paterno, quem sabe até de um irmão mais velho. O poder reprimindo e tentando negar o prazer. O lúdico sobrevivendo e antropofagizando: a patota se institucionalizou e passou a se chamar Grupo de Teatro Mickey. A Disneylândia jamais conceberia o simbólico como pagamento de sua fábrica de mitos. A brincadeira coisificada foi negada no sertão da Paraíba e pra sempre será em qualquer lugar do mundo onde houver meia dúzia de pessoas dispostas a fazer artes e manhas, tardes e manhãs, inclusive noites.

Com a formalização da patota, aí veio “Chapeuzinho Vermelho” e “Branca de Neves”. Depois o início da apropriação socialização de símbolos do cotidiano como “Os mutantes”. Posteriormente, a criação com elementos surreais em “O Sonho da Aranha” e de novo o regional, com “O Bando de Ciganos” e “O Barraco”. O palco já não era só o quintal. Com o passar do tempo, choveram convites para apresentações em colégios, grêmios, festas e finalmente, o corte com o cordão umbilical das preocupadas mães cajazeirenses; a participação nos festivais de teatro infantil em João Pessoa. Nessas viagens, ainda embaladas pelo pó de pirlimpimpim de Sininho, a troca do Mickey pelo Terra montagem e a de “Borboletas” Era o começo da década de 80 e eles estavam grandinhos. O país se preparava para as eleições de 82. A anistia havia vindo restrita e parcial. Eles começavam a viver isso.

Com “Borboletas”, veio o contato primeiro com a Censura Federal em Campina Grande. A peça foi proibida para menores de 18 anos e nenhum dos atores havia atingido ainda a maioridade, mas todos já questionavam no espetáculo a ganância, a exploração de mão-de-obra, o poder. Os inocentes foram chamados de comunistas e de subversivos e seguidores de Karl Marx. Ninguém entendeu nada, e na volta para a cidade natal, depois da geral que foi dada pelos censores, Cajazeiras olhou atravessado para os “esquerdistas” isto resultou em um ano de silêncio e pesquisas. É possível que alguém deles, depois de tanto alvoroço tenham procurado ler “O Capital” em quadrinhos. Grande parte, porém deve te achado melhor, mais saudável e menos chato, apenas ver o retrato do “mestre” em camisetas, onde está escrito: “trabalhadores de todo mundo...”

Após o silêncio de quem sempre está aprontando alguma coisa, veio a montagem de “Beiço de Estrada”. Projeto Vamos Comer Teatro, Festival de Areia, São José do Rio Preto. Agora, Brasília. Depois e sempre, o Brasil. E sempre o mundo. A presença deles no concha-vodromo, logo notada pela imprensa local, pode ser apenas um aviso com endereço certo. Nada de indiretas. Eles são meninos bem-comportados, alunos aplicados, mas, não estudaram na cartilha da Aliança Para o Progresso e se negam a fazer fila diante do Colégio Eleitoral. É isso aí, crianças de Cajazeiras, “Beiço de Estrada”, neles. Já.




fonte: Jornal O Norte. Pág. 5, 22/julho/1984.