quinta-feira, 28 de junho de 2018

SOZINHO NO CINEMA VAZIO

Cleudimar Ferreira

NA SALA 03 DO CINÉPOLIS - MANGABEIRA SHOPPING

O cinema sempre foi uma das minhas paixões. Em um certo momento da minha adolescente vida, até pensei: e se eu morasse dentro de um cinema e o meu quarto fosse a cabine de projeção! A sensação de prazer que sentiria seria do tamanho de um cinema. Ainda não estou um vetusto, mas essa satisfação agradável que carrego em mim, pelo cinema, não teve fim com o passar dos anos. Tanto é que chegando aos sessenta, essa paixão está mais viva do que no passado. Para alimentar esse meu gostar, acabei adotando o Cine Bangüê como companheiro de fins de semana. Quando nos raros momentos que sou impedido de estar nessa sala de exibição, por motivos operacionais inerentes a administração do cinema, procuro refúgio em outras salas existentes na cidade. E assim, termino nas popularescas e apáticas salas dos shoppings.

Agora, estando o Cine Bangüê provisoriamente, pela segunda vez, lacrado por problema técnicos, resolvi apagar o meu cinéfilo fogo pela sétima arte em outras paragens. Aproveitando o recesso junino da escola que trabalho, me arrisquei numa aventura rumo a zona sul de João Pessoa. Fui ao Cinépolis do Mangabeira Shopping, sem prognósticos ou programação nenhuma, na expectativa de naquelas salas, estivesse em cartaz um filme que me convencesse vê-lo, ou que caísse na graça do meu gosto particular.

Ao chegar no meu destino, vi que dos cincos filmes da programação desse dia, de nenhum eu tinha lido a sinopse ou ouvido falar a seu respeito. Sem opção, foi pela intuição. Escolhi a película cômica policial “Oito Mulheres e um Segredo”, do diretor Gary Ross, mais pelo título e pelo elenco que destacava Sandra Bullock, Cate Blanchett e Anne Hathaway, entre as oito mulheres da trama. Comprei o ingresso; esperei um tempo; quando faltava dez minutos para a projeção começar, entrei no cinema na certeza que a sala estava ocupada por pessoas, que ansiosamente esperava o início do filme.

Mas como nem toda certeza pode estar em conformidade com a realidade. A verdade é que ao entrar no interior do cinema, passei naquele momento a ser o único expectador da sala. Não havia uma só pessoa no local. Eu era o único ser vivo ali naquele espaço quase escuro, em silêncio total a contemplar aquela sombria e inerte caixa de exibição.

CARTAZ COM ELENCO DO FILME "OITO MULHERES E UM SEGREDO"

Liguei o celular por um instante na tentativa de queimar o tempo, na angústia de que aparecesse alguém para me fazer companhia. Tudo em vão. Faltando pouco menos de cinco minutos para começar a projeção, eu continuava a ser o único ali, e comigo, as recordações do passado e do presente, que também começavam a passar pela minha mente, como uma fita de cinema sobre uma lente Scope. Os minutos passavam. Veio as lembranças dos grandes filmes que assisti nos cinemas em Cajazeiras e João Pessoa. Nessas recordações instantâneas, repentinas do meu cinema recluso, viajei pelo universo dos faroestes italianos aos filmes policiais, passando aí pelos de suspenses de Hitchcock, até desembarcar nas grandes produções de terror, que por um longo período, colocou em prova meus nervos, deixando-os a flor da pele quando eu ia vê-las em exibição nos cinemas da minha terra.

Não gosto de ver filmes pesados, pois sou um amedrontando de carteirinha. Mas naquela hora, na sala três do Cinépolis, o que predominou nos meus pensamentos e não queria sair, eram as lembranças de filmes como: Psicose, Premunição, O Exorcista e Sobrenatural. Os poucos do gênero terror que ousei assistir e que foram para mim, uma experiência que não quero mais viver. Em um instante, o medo abateu sobre meu corpo. Veio com o medo os arrepios, a tensão. Olhava de lado, sentia a presença de alguns personagens sentados naquelas cadeiras vazias, sobre a penumbra da sala.

O medo só aumentava e a inquietação também. Tentei relaxar, esquecer aquele momento fechando os olhos. Porém as inesquecíveis cenas de Linda Blair em "O Exorcista”, me fez abrir os olhos e foca-los sobre aquela tela vazia a minha frente. Por uns segundos, senti Linda Blair, em 3D, ali presente, com sua voz rouca, revirando os olhos, enroscando o seu pescoço, vomitando verde, vindo em minha direção. Aguçando mais ainda o meu pesadelo, não dando trégua.

Com o emocional fora de controle, percebendo, portanto, que a sala estava ficando pesada demais, resolvi sair. Quando levantei da cadeira, ouvi vozes de um casal que naquele instante adentrava na sala para me fazer companhia. Aliviado com a chegado do casal e não me sentido mais só, decidi ficar. No mesmo instante, me dirigi ao casal afirmando: até que fim vocês chegaram para me fazer companhia! Então, aquele desconhecido rapaz, que fazia par com uma mulher parda, olhou para mim e perguntou: porque? E assim eu respondi a ele: por que eu estava sozinho com os fantasmas desse cinema. Ufa! 

SALA DE EXIBIÇÃO DO CINE BANGÜÊ - FUNDAÇÃO ESPAÇO CULTURAL
ATUALMENTE FECHADA POR PROBLEMAS TÉCNICOS NO 
EQUIPAMENTO DE PROJEÇÃO






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